ESG: o tripé da Nova Corporação Empreendedora

Em um artigo do Economista e Ex-Ministro Maílson da Nóbrega, publicado na Revista Veja há algumas semanas, vimos a sigla ESG apontada por ele como a condição sine qua non para um empreendimento que se autointitule empreendedor sobreviver e se destacar no mundo pós- pandemia e na verdade em qualquer momento de nossa História.

Essa sigla, em nosso modo de ver é a aurora, a definição acabada de uma grande Instituição comprometida de fato com sua própria trajetória e com a de todos os que direta ou indiretamente dependam dela para planejarem suas vidas.

Especialmente de hoje em diante um projeto que almeje a sustentabilidade ou a longevidade de sua operação obrigatoriamente deverá ser construído sobre esse tripé, sob pena de não ter sucesso em um mundo que já não aceita mais atitudes irresponsáveis e indiferentes com relação à ética, à natureza e à gestão consciente.
Mas o que vem a ser ESG?

E: Environment S: Social G: Governance

Em linhas gerais, uma Organização com operação sustentável DEVE:

  • Estar conectada com uma atitude de respeito e resguardo em relação ao meio ambiente;
  • Necessariamente elaborar e aplicar políticas que promovam a comunidade onde atua, diretamente tendo uma ação muito interativa e promotora do desenvolvimento humano e profissional de seus colaboradores, funcionários ou terceiros, e indiretamente atingindo beneficamente as famílias dessas pessoas e por extensão o ambiente em que assentaram suas atividades;
  • Desenvolver boas práticas de gestão de suas lideranças, realizar políticas éticas e transparentes com relação aos seus executivos, seus colaboradores e acionistas, promovendo ações éticas e transparentes para toda a comunidade corporativa e público em geral.

De acordo com a Consultoria Especializada ICTS Protiviti sediada em São Paulo podemos visualizar claramente esse princípio no seguinte quadro:

Percebem como é abrangente este conceito que envolve responsabilidades com o meio ambiente, com a comunidade em geral e com a governança séria e ética de um empreendimento, seja de que natureza for?

O tripé em que deve apoiar-se uma Instituição renovada e atuante a torna, diante da comunidade em que atua, transparente, crível e, especialmente:

Ou seja, este empreendimento assume sua responsabilidade pelos atos que praticar em todos os sentidos, podendo portanto, devido à sua AÇÃO alterar todo o meio em que atua e onde vivem as comunidades que dependam de seu trabalho e isto tanto para o bem quanto para o mal (e disto temos tristes exemplos que ainda, independentemente do Coronavírus, estão vivos na memória e no dia a dia de muitas famílias).

A adoção desses princípios traz vários benefícios para a Instituição que os tem como valores, como por exemplo alguns dos mais notórios:

  • Desenvolvimento de um nome forte, atuante e confiável por toda a comunidade local e internacional, tornando-se uma referência de negócios e ação comunitária;
  • Geração de valor de mercado para a empresa, aumentando sua receita, o interesse de investidores, seu patrimônio, trazendo impactos positivos na atividade de mercado e econômica de maneira geral;
  • Criação de oportunidades de desenvolvimento de novos negócios pelo posicionamento ético e pela plena aceitação da empresa pela comunidade local e internacional, ou seja, a empresa praticante desses princípios tem plena “concordância” de todos os agentes econômicos e de mercado de atuar em parcerias, em várias frentes onde se vislumbre novas oportunidades de crescimento;
  • Movimentação benéfica e atuante do mercado financeiro, através de negociações, compra de ativos e incremento de investimentos na empresa;
  • Desenvolvimento e retenção de seus recursos humanos , seus talentos, que percebendo a convergência de seus valores pessoais com os de sua Instituição, são estimulados a se desenvolverem, a atuarem como empreendedores em suas áreas de atuação, disseminando boas práticas profissionais, criando e transmitindo conhecimentos e desta forma se autodesenvolvendo e gerando valor para outras pessoas.

Para visualizarmos de forma abrangente a importância das três dimensões do verdadeiro empreendedorismo, vamos visualizar um pouco mais de perto cada uma delas a fim de compreendermos o quão fundamentais e críticas são para o sucesso de uma Organização que efetivamente planeje fazer a diferença na sociedade.

ENVIRONMENT

Em 2018, dois economistas americanos foram laureados com o prêmio Nobel de Economia por terem demonstrado a grande interação entre a Economia e o clima e a preocupação de que os governantes precisam efetivamente tomar providências para frear o aquecimento global. Esses profissionais retomaram a essência da Teoria Econômica, ou seja, o fato de que se tem muitas necessidades e recursos escassos para atendê-las, acrescentando às suas dimensões a preocupação com a Natureza, pois esta determina as restrições ao desenvolvimento econômico, cabendo aos agentes econômicos com seu conhecimento saber como lidar com essas limitações de forma a atender eficazmente às muitas necessidades de uma Economia.

Neste sentido, podemos concluir dessa análise ampliada da teoria versus a atividade econômica, que especialmente neste tempo em que vivemos o descaso com a Natureza pode nos gerar grandes e quase que irreparáveis danos ao meio ambiente, espalhando esses efeitos por toda comunidade que viva em um local atingido por acidentes causados pela desatenção pela maneira como a Natureza oferece os recursos nessa região.

Assim podemos tomar como exemplo empreendimentos turísticos sediados em áreas consideradas de risco. Por conta de uma análise superficial e pobre sobre a implementação de uma planta de serviços, onde os objetivos financeiros se sobreponham aos ambientais e sociais, não se considerando que o local é impróprio para o projeto, poderemos ter como consequência (e isso já vimos ocorrer na prática) um desastre socio-econômico, em que vidas podem ser perdidas ou mutiladas permanentemente, áreas podem ser destruídas causando um desequilíbrio no ecossistema local, reputações de quem conduziu o projeto podem ser indelevelmente manchadas e outras tantas consequências advindas de uma visão irresponsável com relação à proteção ambiental.

Um outro aspecto importante que deve ser levado em conta nesta dimensão da atividade econômica, que hoje faz a diferença entre ser mais uma Instituição ou uma grande Instituição, é justamente a percepção que a sociedade terá da gestão de um empreendimento.

Os agentes econômicos ou seja, as famílias que fazem o mercado de consumo girar, hoje adquiriram um nível muito mais maduro e atuante de exigência com relação ao cuidado com a Natureza, a produção dos alimentos e produtos em geral no sentido de questionar como se dá essa produção, o que é feito com os resíduos, os componentes que entram na elaboração de um determinado bem, alimento ou serviço, enfim, tudo nos leva a perceber que se uma empresa não possui uma política de cuidado com o ambiente em que se estabelece, não possui como regra a atenção na forma, nos processos de produção do que quer que faça, pode se arriscar a perder seu lugar no mercado, em benefício de quem está atento a este novo lado da atividade.

Assim sendo é muito importante que unidades industriais primordialmente antecipem a possibilidade de seus processos danificarem o meio ambiente e já preparem-se para eventuais correções de rota, através de planos de despoluição de efluentes industriais, fazendo parcerias com serviços dessa natureza preferencialmente de forma preventiva e não corretiva. A prevenção demonstra cuidado, respeito, sendo que a atitude de correção pode gerar uma impressão de pouco cuidado o que não cria uma boa imagem de um empreendimento diante da comunidade.

Neste sentido, vemos que por uma postura corporativa inadequada, de desrespeito ao meio ambiente e por conseguinte a pessoas que atuam nesse meio, a reputação de uma Organização pode sofrer tamanho dano que se torne irreversível sua recuperação no mercado, causando inclusive oscilações nas operações em Bolsa, por conta de uma ação irresponsável.

Sabemos claro, que acidentes acontecem até mesmo em casos de bons exemplos de atuação, o que nos mostra um outro ponto importante do cuidado com o ambiente: a AÇÃO da Organização envolvida em uma tragédia natural que trouxe danos ao ecossistema local, o reconhecimento público, honesto de um eventual erro e a disponibilidade total para a recuperação de forma direcionada e eficaz, embora infelizmente demorada. Posturas transparentes e honestas são muito bem recebidas e auxiliam a manter a confiança da comunidade em uma Organização envolvida em acidentes ambientais, preservando assim a sustentabilidade do negócio.

Devemos ter sempre em mente que o cuidado com o meio ambiente não interfere de maneira alguma no desenvolvimento econômico, sendo totalmente possível a geração de riquezas e valor para uma Organização e agentes econômicos, que atue de forma a implementar suas melhores estratégias e tecnologia na produção de bens e serviços mas sempre tendo em mente a proteção e recuperação constantes do ambiente em que atuam.

SOCIAL

Outro aspecto importante desse novo indicador que atualmente influencia decisões de investimentos e até autorizações para abertura de capital na B3 é o posicionamento social de uma Corporação, ou seja, sua relação com a sociedade como um todo, seus colaboradores diretos e indiretos, a comunidade local onde atua, a forma como lida com questões sociais, humanas, o respeito que demonstra com relação à diversidade, a cultura, as chances e oportunidades que oferece (e como as oferece) a seus colaboradores, a preocupação com segurança, condições de trabalho, saúde, educação daqueles com quem se relaciona, enfim uma longa e importante relação da empresa com o agrupamento social no qual está inserida.

 A questão do respeito ao capital humano e as condições de trabalho, saúde e segurança que uma empresa oferece é um fator tão crucial nestes tempos de 4ª. Revolução industrial que a descoberta por meios de comunicação, entidades sem fins lucrativos, órgãos de defesa social, entidades religiosas ou quaisquer outras ligadas à promoção humana, de algum desvio de conduta que desrespeite a dignidade da pessoa humana, pode manchar seriamente a reputação e a aceitação de uma Organização no mercado, inclusive gerando desvalorização na quotação de suas ações em Bolsa, caso seja uma empresa de capital aberto.

Em anos recentes tivemos vários nomes importantes no mercado envolvidos com acusações de trabalho escravo e exploração de menores, o que levou muitas pessoas ao redor do mundo a boicotarem as marcas oferecidas pelas Corporações acusadas.

Nada hoje pode ser negligenciado por um empreendimento que pretenda sustentar-se com relação à postura que mostra em seu relacionamento com pessoas, independentemente do grau de proximidade que essas pessoas tenham com o empreendimento.

Uma excelente prática por parte de organizações vencedoras e inovadoras é o que é realizado por empresas brasileiras como a Natura e a BRF, para citarmos dois excelentes exemplos, onde além das preocupações com a promoção do bem estar de todos os colaboradores em todos os graus de relacionamento com essas empresas, percebe-se também uma postura e atitudes de valorização e respeito pela comunidade onde mantem plantas instaladas, participando ativamente de iniciativas locais de promoção e desenvolvimento humano. Isso confere a uma Corporação uma aceitação natural de tudo o que a empresa produz e oferece no mercado, uma vez que seus produtos sempre serão lembrados pelos consumidores como produtos honestos, bem feitos, seguros e alinhados com os melhores princípios de ética e respeito no trabalho, gerando uma fidelização que vai da qualidade do produto em si ao comportamento ético de quem o produz.

Assim todas as Organizações do novo empreendedorismo deveriam contemplar em seus planos estratégicos de médio e longo prazos o item responsabilidade social, desenvolvendo planos de ação para promoção do capital humano próprio, de terceiros e da comunidade onde atuam, oferecendo por exemplo, recursos materiais ou não às autoridades e entidades locais para melhoria na educação , saúde e segurança locais, ações que acabarão no futuro revertendo em frutos para a própria Companhia promotora desses recursos.

Vimos claramente essas iniciativas acontecerem em todo o país por conta da Pandemia do Coronavírus. Por que isso ocorreu somente na Pandemia? Por que não levar adiante essa ideia de associação e criação de grupos de Corporações que SEMPRE promovam ações de bem estar social, sem serem ações assistencialistas e paternalistas, bem entendido? Assistencialismo não traz benefícios a nenhuma das partes porque não promove o ser humano, antes rebaixa-o a uma dependência que não gera nenhum resultado concreto.

GOVERNANCE

O que diz respeito à Governança neste novo modelo de empreendedorismo, cada vez mais presente nas estratégias empresariais por conta das novas exigências do mercado e da sociedade?

Sabemos que a governança está relacionada ao conjunto de políticas, regras, determinações e práticas que conduzem a forma como as Corporações são direcionadas e geridas. Entre essas políticas podemos citar:

  • Como se estrutura seu corpo de Diretoria;
  • Como está determinada a política de sucessões;
  • Como está estruturada a remuneração dos executivos;
  • Como está sua solidez em termos financeiros;
  • Como é sua gestão de riscos, enfrentamento de crises, estrutura de Compliance e auditoria, a segurança de suas informações, seu posicionamento em termos de ética nos negócios;
  • Quais os princípios contábeis que utiliza, qual a transparência de seus resultados para seus colaboradores, acionistas e mercado como um todo;
  • Como são seus Conselhos de Administração em termos de diversidade e independência;
  • Como se estruturam seus comitês de Auditoria e Fiscais.

Todos esses parâmetros são levados em conta por investidores e por decisões de consumo que nestes tempos tiveram um incremento nos níveis de engajamento e exigência de forma que não é mais possível a uma empresa nos dias atuais a ocultação de ações e políticas internas que não condizem com as melhores práticas e posturas de vida. Temos hoje no mercado financeiro investimentos lastreados em empresas ESG, que pela transparência em sua Governança e a preocupação com a responsabilidade sócio ambiental estão entre os mais lucrativos e rentáveis e são muito procurados por investidores. São só chamados Fundos ESG.

Qual o investidor, seja pessoa física ou jurídica, grande ou pequeno que desejará investir em uma empresa em que a conduta de seus responsáveis, a ética em sua governança não seja condizente com os melhores princípios que permeiam a vida de cada um? Você investiria em um empreendimento se soubesse que este tem entre seus hábitos, esconder informações importantes no que diz respeito a suas demonstrações financeiras? Você seria capaz de confiar em quem age fora dos princípios da ética, da conformidade com a lisura em suas atividades? Se concordasse em investir, no mínimo seria cúmplice de atos ilícitos. Com certeza ninguém deseja desempenhar esse papel de conivência com a falta de ética.

Os empreendimentos que continuarem a insistir em agir como quiserem, não seguindo condutas éticas, com certeza em algum momento passarão por dificuldades que poderão levá-los ao sufocamento e consequente desaparecimento de sua operação no mercado.

Do lado das Organizações é muito claro que ainda há muito a se fazer, haja vista quem nem todas estão ainda estruturadas até minimamente para cumprirem seu novo papel na sociedade, sendo que no longo prazo ainda muitas ações em Governança e nos dois outros precisam ser alinhados para que a desejada sustentabilidade seja obtida. Mas no entanto nota-se que o comportamento e as estratégias das empresas hoje tem se alterado com o passar do tempo, seja porque já começaram a incorporar os princípios ESG em sua gestão ou porque perceberam uma alteração e amadurecimento no comportamento da sociedade em todos os níveis e que portanto se desejarem atrair investidores e mais capital, o novo modelo ESG lhes é vital e sua ausência entre seus valores pode levar a Companhia ao isolamento e por fim à sua destruição.

Muitas Bolsas ao redor do mundo já divulgam constantemente os parâmetros do ESG como pré requisitos para abertura de capital e operação em seus ambientes. No Brasil isto ainda não se tornou mandatório porém é um fator importante para os Órgãos Reguladores no momento da análise e decisão da homologação de abertura de capital de uma empresa em Bolsa. É uma tendência que veio para ficar , não cabendo mais retrocesso.

Isto é sinal claro da evolução da sociedade, que busca cada vez mais ser um agente ativo do processo de produção e distribuição de riquezas de um País. A sociedade transformou e reinventou seu papel e tem o direito a ser respeitada em todos os sentidos. Assim a comunidade financeira e econômica tem o dever de entender que hoje NÃO são mais aceitas atitudes e posturas de “enrolação”, pelas quais as capacidades de julgamento e decisão dos agentes econômicos são subestimadas. Isso definitivamente acabou e se perpetuará como um dos bons resultados trazidos pelo enfrentamento da Pandemia devendo já estar incorporado há mais tempo em nossas comunidades.

Mas tudo a seu tempo. Chegou o momento de termos atitudes e posturas que incluam todas as pessoas, em todos os segmentos sociais. Talvez demore ainda mais um pouco, mas o caminho já está aberto, bastando seguirmos por ele, abandonando os comportamentos divergentes anteriores. Isso é muito bom.

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Maria da Penha Amador Pereira, Economista formada pela Pontificia Universidade Católica de São Paulo com especialização em Desenvolvimento Econômico.

Atuou em carreira corporativa na antiga Companhia Energética de São Paulo, Banco do Estado de São Paulo e no Citibank, onde desenvolveu carreira por aproximadamente 30 anos em Controladoria, Planejamento Estratégico, Segurança de Informações, Gestão de Crises e Continuidade de Negócios, Qualidade, Projetos de Melhorias de Processos e Produtos Bancários, Controles Internos, Auditoria, Governança Corporativa, Regulamentação Bancária e Compliance.

Atualmente é escritora com obras já publicadas, Master Coach e PNL, Orientadora e Mentora de Carreiras, Palestrante e Educadora Financeira, tendo publicado mais de 55 artigos em Portais de Empreendedorismo, mídias sociais, jornais e revistas regionais e LinkedIn, além de ter participado de vários seminários e fóruns sobre diversos temas ligados à realidade brasileira e Compliance.

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